Refúgio do ruído Curadoria e textos de João Villaverde |
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Todo dia terminado em 7 (07, 17 e 27) no seu e-mail, de graça. Uma newsletter bem pessoal. Aqui você receberá sugestões de leituras acompanhadas de breves comentários. A ideia do nome veio do ambiente insalubre lá fora, cheio de ruído.
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Empregos em tempos difíceis O que acontece com quem tem entre 18 e 25 anos de idade e estava para entrar no mercado de trabalho quando estoura uma crise?
O economista espanhol Jaime Aurellano-Bover, doutor pela Universidade de Stanford e pesquisador em Yale e no Iza Bonn, fez um amplo e rigoroso estudo a partir de diferentes fontes de dados detalhados (como da OCDE) de 19 países. Encontrou (feitos os controles necessários) que o desemprego entre 18 e 25 anos afeta permanentemente as habilidades dessas pessoas, com consequências visíveis entre os 36 e 59 anos de idade.
Os passos iniciais no mercado de trabalho, aqueles que damos quando começamos, entre 18 e 25 anos, são fundamentais para a acumulação de capital humano.
O desemprego mais adiante, entre 26 e 35 anos de idade, não é significativamente relevante como explicação para persistentes baixas habilidades na vida madura (36-59).
Tem mais: Jaime encontrou nos dados que o desemprego entre os 18 e os 25 anos causa danos permanentes nas habilidades das pessoas mesmo quando elas, na média, buscam educação formal para balancear o fato de estarem sem emprego. |
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Trata-se, portanto, de uma tragédia social de longo prazo quando há destruição de empregos para jovens mulheres e homens.
Não, não seja apressadinho. Achados como esse não levam necessariamente a defender políticas irracionais como aquelas imaginadas pelo governo federal brasileiro (do slogan "O Brasil Não Pode Parar").
Uma coisa é a falta de empregos por uma crise macroeconômica clássica (penso na Grande Depressão de 1929-33 ou nos efeitos da Grande Recessão do pós-2008, notadamente nos países ibéricos e na Grécia; mas vale também para casos idiossincráticos, como a crise brasileira iniciada em 2014). É diferente do que o que ocorre hoje, da falta de empregos por conta do "Grande Desligamento", como Martin Wolf chama este período. Estamos diante de um vírus letal e não há vacina. Isso afeta a todos ao mesmo tempo e as implicações são de outra magnitude.
O que me parece claro é que proteção social importa. Programas sociais, sempre relevantes, são ainda mais importantes em contexto de desemprego de jovens. Uma rede de proteção social é um investimento de longo prazo.
Se você tiver interesse em ler o paper de Jaime, clique aqui. Cheguei até ele por meio da Ana Luiza Pessanha (aliás, ela e Lucas Warwar sempre trazem dicas imperdíveis) |
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FUGA Estou em casa desde 12 de março. Saí apenas cinco vezes desde então (quatro para ir ao supermercado recuperar o estoque caseiro e uma por culpa da Vera Magalhães, que me convidou para o Roda Viva com Armínio Fraga). Então quando não estou trabalhando ou assistindo a Peppa Pig com meu pequeno, estou assistindo as lives caseiras de músicos geniais. Me emocionei vendo Paul Simon interpretar "The Boxer" com seu violão, bem como Paul Stanley tocar "Every Time I Look at You" na íntegra. Os vídeos do brasileiro André Mehmari são espetaculares. Este aqui, em especial. Tive o prazer de vê-lo ao piano em Paraty, na Flip! de 2017, com Bárbara.
Mas meu preferido até agora tem sido o grande Brian May. Como ele foi um dos meus formadores de caráter (sem ironia), assisto May e sou tomado por otimismo. Vamos superar mais essa, tenho certeza.
P.S. Tirei a foto que acompanha a seção Fuga em maio de 2013, durante uma viagem de trabalho ao sertão baiano. Lá na frente está Monte Santo. Saudade de viajar pelo Brasil. |
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A dica dos astronautas Ficar confinado, mesmo que em espaços largos (para quem pode), pode ser desesperador. Quem consegue trabalhar de casa, sente que está trabalhando ainda mais agora no confinamento do que antes. O tempo antes desperdiçado com locomoção para ir e voltar foi ganhado e, bem, virou mais trabalho.
Como manter a mente minimamente estável e uma convivência saudável sem ter a rua (ou restaurantes, padarias, futebol, concertos ou bares com amigos) para extravasar?
Gostei do papo de Christian Davenport com astronautas que estão há quase um ano confinados na Estação Espacial Internacional. |
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"É fundamental estabelecer uma rotina que envolva tudo, do tempo de trabalho aos momentos de higiene pessoal e lazer", dizem eles que lá estão forçados a se encontrar todos os dias para as mesmas tarefas. Há outras dicas também, no vídeo.
Ao final, pensei o quão sortudos são os astronautas neste momento. Além de afastados do vírus (o COVID-19 continua restrito à Terra), eles também não precisam ser expostos diariamente ao show de bizarrices produzido pelas autoridades federais brasileiras, que vão de convocações de jejum para combater o coronavírus à defesa de remédios não testados. A Mariliz Pereira Jorge disse tudo.
Para assistir ao papo com astronautas, clique aqui. |
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Janela indiscreta. Que foto de Victor Moriyama, tirada agora em abril, no Copan, em SP. Dica do grande professor e amigo Maurício Santoro. |
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PENSANDO EM VOZ ALTA O presidente da República tem apenas 15 meses no cargo, mas ele já bateu de frente com seu próprio partido de aluguel (era o PSL), com ex-aliados fiéis (como o falecido Gustavo Bebianno e o general Santos Cruz), com governadores do mesmo campo político (como os governadores Ronaldo Caiado, João Doria e Wilson Witzel), com o Congresso Nacional e, nesta semana, com o (agora ex) ministro da Saúde. Este confronto permanente, com tudo e com todos, é seu all in.
Enquanto isso, uma parte relevante da população pelo país todo ignora o presidente e busca ativamente formas de se proteger do contágio de um vírus letal.
Mas este equilíbrio atual é precário. Assim não ficará porque assim não ficou sob mentes instáveis (como Jânio Quadros e Fernando Collor) ou inábeis politicamente (como Dilma Rousseff). O que está por vir?
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Agora, Bolsonaro precisa entregar para a mesa diretora da Câmara até 15 de maio os resultados de seus exames de COVID-19. O que ocorrerá se ele não entregar ou se entregar e for revelado que ele estava infectado pelo vírus quando convocou e participou de aglomerações no dia 15/03?
O vice-presidente, general Mourão, já disse que seria "o pior dos mundos" o presidente ter mentido sobre assunto de tamanha gravidade.
É um grande "se", claro. Mas aqui, pensando em voz alta com você, vejo no horizonte o ressurgimento da PEC do semi-presidencialismo, que formalizaria na Constituição o arranjo político instalado em governos como de Itamar Franco (1993-94) e Michel Temer (2016-2018). Seria uma espécie de "ponte" formal, que viabilizaria politicamente um acordo entre diferentes (a esquerda, reticente com Mourão, e a direita, que teme que dois anos mais de Bolsonaro queime tanto a imagem da direita que torne inevitável a volta da esquerda) e um governo Mourão.
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P.S. A foto que acompanha essa seção Pensando em voz alta eu tirei no solstício de junho de 2016, no Grand Canyon. |
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PAUSA Estou fascinado pelo Aria Code, podcast liderado pela fabulosa Rhiannon Giddens em parceria com a The Metropolitan Opera. Quem me indicou foi o amigo Rodrigo Uchôa. Os episódios são dinâmicos, com entrevistados que vão de neurocientistas a garotas de programa, passando por histórias de bastidores e música de primeira linha.
Meu episódio favorito é o que trata da ária de Cinderella, a ópera de Rossini. Rhiannon conversa com a soprano venezuelana Alma Salcedo, que foi a Espanha em busca de tratamento para o câncer da mãe. Fez todo tipo de trabalho para conseguir pagar as contas e agora se estabeleceu como uma grande voz. Ao final do programa, outra soprano, Joice DiDonato, interpreta a ária final como composta por Rossini. É arrebatador. P.S. Tirei a foto que acompanha esse segmento Pausa dentro de um prédio em Paris, numa viagem de trabalho em outubro de 2019. |
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Sobre a newsletter Decidi escrever essa newsletter para compartilhar com amigas e amigos alguns pensamentos e algumas das leituras mais interessantes que venho fazendo. Se você tiver dicas na linha do que encontrou aqui, me mande! Todo dia terminado em sete (07, 17 e 27) mandarei ela para você. A mais recente, que enviei dez dias atrás (07/04), pode ser lida clicando aqui. P.S. Eu tirei a foto que acompanha esse segmento durante uma viagem de trabalho para Londres em fevereiro de 2019. Estamos dentro do Ship´s Tavern, uma taverna instalada no centro de Londres desde 1549 (você não leu errado; o bar foi inaugurado um século antes de Hobbes escrever O Leviatã e antes, também, da Revolução Gloriosa).
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Obrigado por chegar até aqui. No dia 27 tem mais. |
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