1. Quando, onde e como iniciou seu trabalho com PLE?
Eu comecei o trabalho com PLE de uma maneira muito informal: há aproximadamente 10 anos, em Porto Alegre, quando já havia terminado a graduação em Letras e começado o Mestrado, a esposa de um amigo que era argentina, a Cristina Ljungmann, me pediu aulas de Português. E como na faculdade abordavam muito superficialmente essa possibilidade de trabalho, eu achava que não teria competência nem formação suficientes para ensinar minha língua materna como uma língua estrangeira. Depois, essa amiga, que tem uma escola de línguas, tornou-se uma grande parceira, abrindo as portas da sua escola para o meu trabalho.
2. Por que quis alinhar seu trabalho com a área do PLE? O que mais chamou sua atenção?
Me lembro que, durante uma aula particular, logo no início da minha carreira, uma aluna irlandesa que já tinha um nível avançado de português me fez uma pergunta e, no que respondi, ela anotou rapidamente a resposta no seu caderno em inglês, sua língua materna. Nesse momento, me dei conta de que estava diante de uma pessoa cujo pensamento era todo estruturado em uma outra língua, e com isso vinha todo o
seu olhar sobre o mundo. Esta pessoa estava diante de mim, querendo compreender ainda mais a língua do meu país, para poder também compreender os meus códigos e meus valores. Vi assim que havia um abismo gigante entre nós duas, que eu estava vendo nela apenas a ponta de um iceberg, mas que havia algo dinâmico e vivo que nos aproximava: o interesse pelo português e por tudo que vem junto. É isso então
que me encanta no meu trabalho: a possibilidade de confrontar mundos, culturas, de pensar em como a minha língua se configura sob o olhar do estrangeiro e como nós dois, professor e aluno, nos constituímos por meio dela.
3. Quais trabalhos relevantes já desempenhou em PLE?
Já fui coordenadora pedagógica na Portuguese Language School na Austrália, em que, além de auxiliar a estruturar todo o currículo, também me cabia organizar seminários de formação dos professores; também na Austrália, ministrei cursos de PLE na University of New South Wales.
4. Como foi seu planejamento para ir à França? Por que escolheu este país e como foi o processo de sua admissão?
Eu sempre quis ir para a França, em virtude de já falar o francês e de me identificar com a cultura francesa. Depois de voltar da Austrália, quando retomei os trabalhos na escola da Cristina, tomei conhecimento do programa Leitorado, organizado pelo Itamaraty. É um programa muito interessante, que abre vagas todo o ano, para enviar professores de PLE para trabalharem em várias universidades do mundo. Calhou de ter uma vaga para a Sorbonne Nouvelle e de eu preencher os requisitos. Fiz a inscrição, enviei meu dossiê e fui selecionada.
5. Qual trabalho desempenha, atualmente, na França?
Como Leitora neste programa de parceria do Itamaraty com a Paris III, eu desempenho três funções: ministrar aulas de Português na Graduação em Letras/Português; coordenar a aplicação do exame CELPEBRAS e desenvolver projetos de difusão da língua e da cultura junto à embaixada do Brasil na França, que é sempre muito aberta às minhas propostas. Atualmente, dois projetos que estão em andamento e que foram muito bem acolhidos são o curso de formação de professores de PLE (que já está em sua segunda edição) e um Núcleo de Estudos em Metodologia de PLE, derivado do primeiro grupo que concluiu o curso.
6. Qual sua opinião em relação ao CELPE-BRAS no que diz respeito ao conteúdo cobrado nas provas?
Acho o conteúdo do CELPE-BRAS muito sensível à cultura brasileira e aos assuntos atuais como um todo. Nesse sentido, ele é muito acessível ao candidato, visto que o conteúdo é sempre potencialmente interessante e possível de ser desenvolvido por qualquer pessoa. No entanto, a abordagem do Ensino por Tarefas (que consiste grosso modo a colocar o uso da língua em um contexto, em que o usuário dirige-se a um público específico com um determinado objetivo e, para isso, deve adequar a estrutura da sua produção escrita e o vocabulário a um gênero textual específico) é levada muito ao pé da letra na elaboração das provas do CELPE-BRAS. Isso acaba deixando um pouco de lado o trabalho de compreensão e de interpretação, privilegiando as competências de produção escrita e oral do aluno, além de muitas vezes ele ter de se colocar em papéis os quais jamais talvez venha a assumir na vida real: o de um jornalista, o de um
publicitário, etc.
7. Você trabalha em um projeto chamado FALANDO BRASILEIRO. Explique o que é este projeto.
Quando finalmente direcionei minha carreira para o ensino de PLE (antes eu era professora de Português e Literatura no Ensino Médio), senti falta de uma fonte didática e metodológica muito recorrente em outros países: sites - geralmente vinculados às mídias estatais - que fornecem informação relevante sobre ensino e aprendizagem da sua língua como língua estrangeira. Na Inglaterra, por exemplo, há o British Council, que fornece dados sobre Inglês Língua Estrangeira; aqui na França, os canais de comunicação também têm, em seus sites, páginas destinadas a ensinar e aprender Francês Língua Estrangeira, como a Radio France Internationale e a TV5. Assim também o é em diversos outros países. No Brasil, não há esse tipo de espaço. Então resolvi criá-lo, em parceria com meu sócio, Tiago Becker. O Falando Brasileiro é um portal onde alunos e professores podem encontrar todo tipo de informação sobre ensino e aprendizagem de PLE: desde lista de escolas no Brasil e no mundo, até planos de aula, teste online, material didático, análise de livros didáticos, eventos, vagas e oportunidades, entre outros. Infelizmente é um projeto que está parado por falta de recursos e de apoio financeiro.
8. Quais as perspectivas que considera para seu trabalho com o PLE? Quais são seus objetivos?
Ainda permaneço como Leitora na Sorbonne Nouvelle por mais 2 anos e meio. Quero fazer o doutorado e seguir trabalhando na área, seja na França ou em outro lugar, dando aulas ou trabalhando principalmente com formação de professores. Mas sobretudo desejo poder me dedicar ao Falando Brasileiro.
9. Você entende que a Língua Portuguesa vai, cada vez mais, posicionar-se como uma língua importante em todo o mundo?
Ela não vai: ela já está. Desde que comecei a trabalhar com PLE, vejo que o interesse pelo português (sobretudo do Brasil) tem aumentado e, mesmo com a crise, os estrangeiros ainda veem o Brasil como um potencial econômico, fora o fato de que há muitos brasileiros pelo mundo todo. Além disso, as pessoas têm cada vez mais se informado sobre o país, o que tem, aos poucos, derrubado alguns estereótipos e tornado
nossa cultura - e por consequência a língua - um pouco mais interessante e autêntica aos olhos dos estrangeiros.